01 abril, 2015

Meu Pai

Nas lembranças que tenho dele, em quase todas o vejo da mesma forma: sempre sentado na mesma cadeira, cigarro aceso em uma das mãos, jornal aberto sobre a mesa à frente, com semblante fechado, indecifrável.
Dividia a atenção entre a leitura e a televisão, sempre ligada, no canto da sala.
Falava e se movimentava pouco pela casa. Limitava seu espaço de forma rotineira, sistemática: pela sala, quarto e cozinha. Me habituei à sua presença em cada um daqueles cômodos, povoando a casa que era, de certa forma, sua imagem:  forte, segura e permanente.

Mas nos dias em que a família se reunia, filhos e netos juntos, seus olhos ganhavam um brilho novo. Gostava do burburinho, do vai e vem dentro de casa, da fartura dos almoços e da confusão que se formava.  Em dias de festa, acertava logo um jogo de truco, escolhia um parceiro e arrumava a pequena mesa para quatro. Era fácil saber quando ganhava dos parceiros, pois os gritos, entremeados de risadas, podiam ser ouvidos na casa toda: “seis mi, ladrão!” e lá vinha ele, escondendo uma carta de baralho, brincando ou blefando, eu nunca soube.

Mais do que ensinamentos, ele me deixou referências.
Marcas que até hoje procuro cada vez que o caminho se torna mais árduo, e preciso ser forte.

E hoje, todas as vezes que a saudade é dolorosa, me abrigo nesse abraço de memórias, buscando forças para seguir em frente, mesmo quando as pessoas que amo vão  ficando pelo caminho.

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